"Revelações de um Esquizofrênico" - Uma Compreensão Psicológica do Canibal de Garanhuns!
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O caso
“Revelações
de um Esquizofrênico” é um livro de 48 páginas produzido por Jorge Beltrão
Negromonte da Silveira, antes (ou durante) cometer vários crimes de homicídio
no Estado de Pernambuco, juntamente com sua esposa, Isabel Cristina e Bruna
Cristina Oliveira da Silva, sua amante, em que narra episódios de paranóia,
alucinações e canibalismo, todos retratando a realidade vivenciada pelo
triângulo amoroso e a vida do autor, no qual Jorge aparenta ser o principal
personagem.
O livro
“Esquizofrênico desde jovem, nunca
deixou de seguir sua estrada. Uma estrada árdua, cheia de altos e baixos, mas
que nunca o desanimou”
Marcado
pelo impressionismo, alternando entre pinturas e descrições, o autor parece
fazer questão de preservar um “tom” poético ao texto, imprimindo nele uma
intencionalidade perturbadora, inquietante, porém, assustadoramente coerente
no que diz respeito à percepção do que faz. Jorge Beltrão não “vomita”
palavras, ele simplesmente as constroi. Não as descontextualiza, mas emprega em
sua narrativa, caracterizada pela ordem dos capítulos, uma “linha temática”, a
qual parece intencionalmente querer retratar sua angústia frente as reações
vivenciais. Seria isso a revelação de um sujeito consciente de sua enfermidade,
contrariando, portanto, a ideia de que um psicótico seria incapaz de reconhecer
sua enfermidade? Pensemos adiante.
Aspectos Psicológicos
Ao que tudo indica, Jorge Beltrão Negromonte sofre de transtorno psicótico esquizofrênico, apesar de existir controvérsias entre profissionais de saúde quanto a precisão do diagnóstico. Uma Psicose funcional
de personalidade também esquizóide. Com traço paranoico-delirante (CID F20.0), a ruptura com a realidade se fez
presente ainda quando criança, ao relatar experiências com três supostos
amigos, os quais permaneceram durante sua fase adulta, estando ainda crianças.
Faz
entender que tinha um bom relacionamento com a mãe, mas revela distanciamento
dos irmãos, preferindo os amigos imaginários (isolamento social). A perda do
pai e as frequentes menções a ele como “mestre” que o acompanha em momentos
importantes, tal como sua formatura, sugere
um fator traumático afetivo que pode ter ou não contribuído para o agravamento
de suas crises. Poderíamos então considerar um estresse pós traumático como
potencializador de um quadro esquizofrênico grave?
O
livro demonstra elementos religiosos presentes a todo momento, uma das
características comuns na personalidade psicótica. Alega o Jorge que as mortes
das vítimas eram para purificação da alma, obedecendo um “raciocínio” que daria
continuidade com as mortes seguintes (semelhante conceito de pureza adotado por Adolf Hitler, apenas com nuances diferentes). Esta inclinação fanática é também
demonstrada por ele no filme “Espírito”, também criado e dirigido por ele, com
cenas de canibalismo e assassinatos. Difícil é esclarecer o motivo pelo qual a
temática mística é tão comum na fantasia delirante.
As
pinturas presentes no livro, de conotação impressionista,
poderiam facilmente arrebatar elogios da crítica especializada, se não
trouxesse por trás tamanha realidade consumada por sua vida prática. Não só as pinturas,
como os poemas, aludindo a um verdadeiro “boca do inferno”, seriam obras apreciadas sob a óptica antropofágica (movimento literário
brasileiro), penso eu (se estiver errado os literários que me corrijam), se não encontrasse paralelo com a vida prática deste
que, embora, talvez, tentasse (aparentemente) canalizar sua perversidade
delirante à criação artística, sucumbiu à triste incapacidade de distinguir
o mundo real da imaginação, enquadrando-se, portanto, como doente mental.
Finalmente, apesar
de seu quadro psicótico desde muito novo, Jorge Beltrão desenvolveu certos
relacionamentos, foi graduado faixa preta em Karatê, formou-se em Educação
Física, foi empreendedor, ator, professor, compositor, tinha poder de convencimento e
habilidades de conquistas, tudo isso enquanto já vivenciava sua psicose, sem
qualquer auxílio de antipsicóticos, segundo ele, descartados voluntariamente
ainda enquanto jovem. Tais relatos nos desafia e mostra o quanto os fenômenos
psicóticos são vastos e ainda parcialmente comprendidos pela ciência,
pois, especulando o caso, poderíamos questionar: tais feitos poderiam revelar
não apenas uma aparente capacidade de transitar entre o real e o imaginário,
mas de tornar um, ou outro, apenas o reflexo de uma intencionalidade, ainda
que inconsciênte e primitiva, elaborada ou não? Fica a questão.
Abraço e até a... Ou melhor, quanto a esse assunto, até nunca mais!